A utilização de ferramentas colaborativas na gestão do Direito

Daniel Cavalcante Silva 

Em meio a todas as vicissitudes do torvelinho jurídico, o profissional do Direito costuma encontrar grandes dificuldades operacionais quando tem necessidade de adequar seus conhecimentos jurídicos à utilização de ferramentas de outras áreas do conhecimento. É o caso das metodologias de gestão, que podem ser um grande tormento, pois o advogado não é gestor exceto dos processos que lhe são confiados.

Embora a gestão de processos não seja ensinada nas cátedras da faculdade, as novas tendências apontam esse gerenciamento como uma obrigação natural da profissão, na medida em que permite ao advogado maximizar o resultado prático de várias intervenções jurídicas, a exemplo da implementação de projetos de compliance e na gestão de contratos complexos.

É cada vez mais comum encontrar advogados produzindo artefatos de um plano de projeto tradicional apenas para cumprir um protocolo perante o cliente. A ferramenta utilizada na gestão desses projetos é o velho e bom Excel, sendo que os mais inovadores utilizam um modelo de Project Charter para apresentar o projeto, ou seja, um modelo introdutório do que se pretende realizar com o projeto jurídico a ser implementado.

Não se tem como criticar essas iniciativas, desde que as expectativas sejam atingidas. Mas a questão ganha outros contornos na medida em que novas perspectivas sejam exigidas na atuação do advogado, a exemplo da necessidade de atuar em conjunto com diversos setores de uma empresa na consecução de um objetivo comum, compartilhando e gerenciando expertises diversas. Dentro dessas perspectivas, pode-se constatar a crescente utilização pelos advogados de novas metodologias e ferramentas colaborativas.

No que tange aos contratos complexos, por exemplo, imagine-se um contrato de fusão de duas grandes empresas no setor de educação, com a saída de alguns acionistas majoritários, a previsão de locações imobiliárias para os acionistas retirantes, a necessidade de readequações regulatórias, equivalência trabalhista, tratamento das contingências, gestão de parcelas compensáveis, transferência de tecnologia, entre diversos outros detalhes que transformam o contrato em um emaranhado de informações que ligam expertises jurídicas diversas. Imagine a dificuldade do cumprimento deste contrato, que não se encerra com a assinatura do mesmo, muito pelo contrário, inicia-se uma nova fase, qual seja a gestão do contrato.

Uma solução bastante efetiva na gestão desse tipo de contrato, por exemplo, é o Project Model Canvas. A ferramenta faz todo o sentido, pois a parte burocrática já está prevista no próprio instrumento contratual, mas a sua implementação e gestão deve ser fluída para não prejudicar o andamento da empresa.

A ferramenta, em sua essência, permite a criação de um plano de projeto com participação e engajamento de uma equipe e principais stakeholders, podendo ser aplicada a qualquer projeto. Seu diagrama lógico propõe a estruturação dos stakeholders (junta comercial, cartório de registro de imóveis e outros), da equipe (advogados responsáveis pelo gerenciamento do contrato), premissas (como atingir ao objetivo), riscos (mensuração do risco de cada etapa; exemplo: o CADE autorizará a fusão?), grupos de entrega (divisão das tarefas previstas no contrato), linha do tempo (acompanhamento do cumprimento do contrato por etapas), custos (acompanhamento das provisões previstas em contrato), requisitos (descrição das funções e demais elementos da equipe), produtos (resultados mensuráveis do trabalho da equipe), justificativas (maximizar resultados do contrato), objetivos (cumprir o contrato em sua integralidade) e benefícios do projeto (dar segurança e agilidade ao cumprimento do contrato).

Uma vez aplicada a um contrato de fusão como o exemplificado, a equipe envolvida na gestão do contrato é capaz de pensar, analisar e formalizar todas as variáveis para gerenciar as etapas do cumprimento do contrato e realizar o seu monitoramento e controle, até o encerramento. E sempre que houver mudanças ao longo das etapas, a exemplo das intercorrências oriundas da exigência de passivos não contingenciados (como as ações trabalhistas) é possível readequar a ferramenta facilmente ao restante do contrato.

Seguindo a mesma lógica, o modelo também pode ser aplicado na implementação de projetos de compliance, como em uma entidade do terceiro setor, por exemplo, pois unificaria uma abordagem heterogênea de entendimentos sobre o mesmo objetivo, permitindo que sejam criadas políticas e diretrizes institucionais, além de detectar, evitar e tratar qualquer desvio ou inconformidade, para que a instituição possa cumprir com os mais rigorosos critérios que a credenciem como entidade beneficente de assistência social (entidade filantrópica). A função do compliance, nesse caso, vai além das barreiras legais e regulamentares, incorporando princípios de integridade e conduta ética na instituição para cumprir o seu mister.

A apresentação de metodologias ágeis e ferramentas tecnológicas, ao contrário do que possa parecer, simplifica bastante a atuação do profissional do Direito no seu mister primário, seja no foro ou em consultorias, fazendo com que o mesmo ganhe tempo para dedicar-se a outros afazeres. São soluções que permitem o cumprimento de estratégias jurídicas com agilidade, segurança e envolvimento colaborativo.

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