A ameaça do litisconsórcio multitudinário à rápida solução do litígio em processo cível

A ameaça do litisconsórcio multitudinário à rápida solução do litígio em processo cível

Drª. Andressa Reais, advogada associada da Covac Sociedade de Advogados

 

Recentemente, em processo patrocinado pela Covac Sociedade de Advogados, ajuizado por associação estudantil em face de mais de vinte instituições de ensino superior simultaneamente foi proferida importante decisão determinando que a autora limitasse a quantidade de integrantes do polo passivo, por se tratar de litisconsórcio facultativo, a fim de que apenas uma das instituições de ensino fosse mantida, à sua escolha.

Argumentou-se que, diante da diferente realidade entre as empresas, como tipos de cursos, público alvo, impactos econômicos, poderio econômico, dentre outros, acabaria por ensejar desfechos distintos, pois as provas a serem produzidas devem sempre levar às peculiaridades de cada instituição, além dos sigilos fiscais e bancários que devem ser protegidos.

A tese apresentada não olvidou a possibilidade de a legislação processual cível permitir que duas ou mais pessoas litiguem no mesmo processo, em conjunto, seja ativa ou passivamente, quando houver entre elas a comunhão de obrigações ou de direitos vinculados, seja em razão da conexão pelo pedido, pela causa de pedir ou, ainda, quando presente a afinidade de questões de fato ou de direito.

Sabe-se que a formação do litisconsórcio resulta em benefícios, como a economia processual, já que evita a repetição da prática de atos, e a harmonização dos julgados, que impede que decisões contraditórias sejam proferidas, privilegiando o princípio da segurança jurídica.

Diante desse raciocínio, não é incomum que se ajuíze demanda com a acumulação de pessoas – físicas ou jurídicas, em alguns dos polos – a fim de que um mesmo assunto seja decidido de maneira única pelo Poder Judiciário.

Não se pode perder de vista, contudo, as premissas que fundamentam a legislação processual já que na sua Exposição dos Motivos é advertido que, sendo ineficiente o sistema processual, todo o ordenamento jurídico passa a carecer de real efetividade. Isso porque a preocupação em se preservar a forma sistemática das normas processuais, longe de ser meramente acadêmica, atende sobretudo a uma necessidade de caráter pragmático: obter-se um grau mais intenso de funcionalidade.

O Código de Processo Civil dispõe sobre as hipóteses em que a formação de litisconsórcio é permitida, com a ressalva de que o juiz poderá limitar o litisconsórcio facultativo quanto ao número de litigantes na fase de conhecimento, na liquidação de sentença ou na execução, quando este comprometer a rápida solução do litígio ou dificultar a defesa ou o cumprimento da sentença.

Diante dessa premissa, dadas as peculiaridades do caso, a inclusão de número desproporcional de integrantes em algum dos polos, chamado de litisconsórcio multitudinário, diferente de uma ação coletiva, diante da individualidade das características, poderá prejudicar o andamento processual, pois demandará interminável produção de provas, com a apuração de peculiar situação de cada integrante do polo passivo, exigindo desnecessariamente que uma pessoa aguarde toda a instrução probatória que se mostrar necessária para a outra, dentre outras consequências, a fim de que apenas após se alcance decisão de mérito.

Fatalmente esse cenário dificultará a defesa, comprometendo a rápida solução do litígio e a paridade de tratamento entre as partes, bem como o dever do juiz de observar e promover a eficiência, em manifesta afronta a dispositivos do Código de Processo Civil e ao direito à ampla defesa e ao contraditório protegidos pela Constituição Federal, o que não se pode admitir.

Como alternativa a tal limitação, o Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) emitiu o Enunciado 116 que consigna que, diante da verificação da prejudicialidade do litisconsórcio multitudinário, o juiz poderá substituir a sua limitação pela ampliação de prazos, sem prejuízo da possibilidade de desmembramento na fase de cumprimento de sentença.

Além disso, na hipótese em que o magistrado realmente entenda pela limitação do litisconsórcio, a corrente doutrinária que tem prevalecido sustenta que nessa mesma decisão deverá ser determinado o desmembramento da relação jurídica processual com a criação de novos processos – tantos quantos forem necessários – com os sujeitos excedentes (Enunciado 386, do FPPC), que conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça representa mero procedimento e não importa em propositura de nova ação (AgInt nos EmbExeMS 6019/DF).

Essas demandas serão distribuídas por dependência para o mesmo juízo, em respeito ao princípio do juiz natural, resultando no comando de mais demandas para o juiz, contudo, preservadas as garantias constitucionais, como a interrupção da prescrição, que retroagirá à data de propositura da demanda original (Enunciado 10, do FPPC).

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